Vestir é a forma mais fácil de se expressar, diz presidente da Comme des Garçons

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Embora sejam peças muito distintas, uma camiseta estampada com um coraçãozinho de olhos esbugalhados e um moletom furado como uma rede têm, por trás delas, algo em comum -a visão criativa de Rei Kawakubo, fundadora e diretora criativa da Comme des Garçons. A marca, uma das mais importantes da história da moda, abre nesta sexta-feira uma loja em São Paulo, a sua primeira na América Latina.

Quando se fala da japonesa de 82 anos, seu nome carrega predicados como vanguardista e inovadora, porque ela ajudou a definir, desde os anos 1970, parte do que se vê na moda atual. Kawakubo é creditada como uma das primeiras a fazer roupas com aspecto destruído, a popularizar o look todo preto dos criativos das grandes cidades e a criar peças com proporções exageradas, esculturas de tecido para vestir.

Se estes looks tendem a ser preferidos pelos mais ousados, há um outro, mais fácil de vestir, que também leva a da Comme des Garçons. É a linha Play, do coraçãozinho vermelho, que está nos pés de muita gente estampado num tênis All Star popular em São Paulo, calçado que dá a quem o usa um ar de descolado, por ter sido abençoado por Kawakubo.

Na loja de 160 metros quadrados que inaugura nesta semana no shopping Iguatemi, com design concebido pela própria Kawakubo, um pouco de cada um desses universos fashion estará presente, além de algumas peças de desfile, ainda mais experimentais.

Quem conta é Adrian Joffe, marido e porta-voz de Kawakubo e presidente da marca, e James Gilchrist, vice-presidente da Comme des Garçons para as Américas.

“As pessoas estão procurando cada vez mais se expressar individualmente ao invés de seguir os outros, e se vestir é a maneira mais fácil de se expressar. Elas estão querendo mais coisas criativas. Não querem se parecer como tudo mundo, necessariamente”, afirma Joffe, ao comentar o que atrai os consumidores para a Comme des Garçons, conhecida pelos seus designs vanguardistas.

Se fora do Brasil é comum encontrar Comme des Garçons em lojas multimarca ao lado de outras grifes conceituais -como Rick Owens e Ann Demeulemeester-, em São Paulo a etiqueta estará num shopping que é a casa das marcas de luxo preferidas dos ricos brasileiros, como Gucci e Louis Vuitton. Isto não seria uma contradição?

“Temos uma gama muito ampla de clientes. Qualquer pessoa, três gerações, às vezes quatro gerações, porque estamos no mercado há muito tempo. Somos uma empresa de sucesso, mesmo que de vanguarda e muito criativa”, diz Joffe, acrescentando que se sente “muito bem” pela Comme des Garçons estar nos mesmos corredores de etiquetas de luxo com apelo comercial.

Ele afirma também que, nos últimos cinco ou dez anos, a marca está vendendo mais os looks de desfile e as peças ousadas, itens que antes eram reservados para a arela, as vitrines ou a produção de uma imagem. O principal mercado para este tipo de roupa são os Estados Unidos, acrescenta Gilchrist.

Joffe credita este fato a uma “reação ao peso das marcas de luxo”, que ele afirma -e isto é fato- venderem em todos os lugares e trocarem de designers o tempo todo. “A fidelidade a marcas talvez tenha enfraquecido. Então as pessoas estão mais livres para escolher por elas mesmas, talvez”, diz, com a diplomacia de quem não quer confusão com os vizinhos.

A loja de São Paulo também vai vender carteiras e os perfumes da marca -com o vestuário, o mix de produtos dará uma boa ideia da estética da Comme des Garçons. Existem outras cerca de 30 lojas no mundo como esta, sendo 17 no Japão, o principal mercado da empresa, responsável por 50% das vendas, de acordo com os executivos.

Como a imprensa só terá o à loja na quinta-feira, ainda não foi possível ver sua arquitetura, mas Kawakubo -que não veio ao Brasil para a inauguração e quase nunca dá entrevistas- acompanha a distância, por fotos, os toques finais no espaço, além de ter enviado um arquiteto japonês de sua confiança para a finalização.

Segundo Gilchrist, a vitrine da loja será toda preta, só com o logo da marca bem pequeno num canto, uma escolha inusual de design, sobretudo se considerarmos que o ponto de venda fica num shopping. Isso tem a ver com o pensamento de Kawakubo de que a descoberta tem que ficar a cargo das pessoas, de acordo com seu marido.

“Se [alguém] disser onde algo está, você fica feliz, porque você gosta. Mas se você descobrir sozinho, sem que ninguém lhe diga, você fica mais feliz. Então é isso que ela quer”, diz Joffe.

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