BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – O acerto anunciado no domingo (8) pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, com líderes do Congresso Nacional se concentrou em ações para aumentar a arrecadação do governo federal e deixou de fora medidas para cortar despesas. A proposta reduz a um terço o impacto do decreto de alta do IOF (Imposto sobre Operações Financeiras) e compensa essa diferença com outras tributações.
Haddad levou aos parlamentares uma apresentação que mostrava uma explosão de gastos nos últimos anos com o Fundeb (fundo voltado para a educação básica), com emendas parlamentares, com o BPC (Benefício de Prestação Continuada) e com transferências para estados e municípios.
No PowerPoint do ministro, o pacote para fazer a recalibragem imediata do IOF se concentrou em pontos de arrecadação, como a taxação de bets, isenções tributárias e mudanças na cobranças de impostos sobre títulos. A reportagem apurou com pessoas que participaram da reunião que a ideia era buscar uma proposta também de cortes de despesas, mas houve resistência pelos parlamentares.
Parlamentares que estiveram no encontro disseram que Haddad citou propostas para travar o aumento das despesas do Fundeb e controlar o aumento de despesas com o BPC.
No caso do Fundeb, o Ministério da Fazenda calcula que, a partir de 2027, a transferência federal para o fundo ficaria em torno de R$ 50 bilhões maior do que hoje. A pasta gostaria travar esse aumento para reduzir essas despesas.
Os próprios líderes governistas, no entanto, se manifestaram contra alterações nesses dois pontos agora, o que fez com que o corte de gastos fosse deixado em segundo plano, e o acordo se concentrasse em medidas de curto prazo para compensar a recalibragem das alíquotas do IOF.
O PowerPoint de Haddad não fez nenhuma menção a uma mudança nos pisos constitucionais da saúde e educação, que foi defendida pela cúpula do Congresso nas últimas semanas. De acordo com relatos, o próprio presidente Lula se opõe à medida. Além disso, há resistências entre os parlamentares de apoiar uma matéria considerada impopular em ano pré-eleitoral.
Uma proposta ampla sobre a taxação das criptomoedas também está entre as medidas que estavam na apresentação de Haddad, batizada de “Pacto pelo Equilíbrio Fiscal do Brasil”.
O ministro se reuniu com líderes da Câmara e do Senado, além dos presidentes das Casas, Hugo Motta (Republicanos-PB) e Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), respectivamente, em encontro que durou cerca de cinco horas no domingo (8). A reunião ocorreu na residência oficial da presidência da Câmara, em Brasília. No jantar, foram servidas pizzas.
Após a reunião, Motta, Haddad e Alcolumbre disseram que as medidas de redução das despesas primárias do governo serão discutidas numa próxima reunião, sem data marcada. Eles não citaram nenhuma delas. Motta reforçou, porém, que a proposta de reforma istrativa, faz parte do acordo.
Interlocutores do presidente da Câmara disseram à reportagem que o primeiro o foi dado com o recuo de Haddad no decreto do IOF. Na reunião, o ministro recebeu críticas pelo aumento do imposto, de acordo com relatos. Nas redes sociais, Motta escreveu que o recuo do decreto foi uma “vitória do bom senso”.
“O Congresso cumpriu seu papel com firmeza e responsabilidade ao reagir ao decreto. Não se trata de confronto, mas de equilíbrio. Imposto não pode ser solução fácil”, escreveu ele na rede X, antigo twitter.
Segundo relatos de dois parlamentares que estiveram na reunião, o deputado Pedro Paulo (PSD-RJ), relator do grupo de trabalho da reforma istrativa na Câmara, fez uma provocação em sua fala dizendo que não viu, na apresentação da Fazenda, medidas que tratassem das despesas primárias.
Como resposta, Haddad teria cobrado dos deputados e senadores propostas que já foram enviadas ao Congresso, mas ainda não avançaram, entre elas a dos supersalários e do aperto na Previdência dos militares.
O ministro da Fazenda queria que a proposta de corte das isenções fosse feita por meio de PEC (Proposta de Emenda à Constituição), mas a ideia não prosperou. A percepção das lideranças foi a de que Haddad teria a intenção de mexer nas brechas das chamadas imunidades tributárias como as religiosas e as sem fins lucrativos.
Na saída da reunião, Motta falou que o corte das isenções será feito por meio de proposta infraconstitucional e deixou claro que o modelo para a implementação da redução será definido pelo Congresso. O Congresso quer deixar de fora os benefícios do Simples. Zona Franca de Manaus e fundos regionais.
A proposta de Haddad também inclui alta de 15% para 20% na alíquota do J (Juros sobre Capital Próprio).
Segundo dois participantes da reunião, Haddad afirmou que outros ministros da Fazenda já tinham editado decretos sobre o IOF e que nunca houve uma reação como essa, já que é uma prerrogativa do governo federal.
De acordo com relatos de um líder, Alcolumbre teria dito em resposta à Haddad que o decreto da Fazenda foi criticado até mesmo por integrantes do PT, partido do ministro.
Parlamentares afirmaram à reportagem que o governo preciso entender que a correlação de forças entre Executivo e Congresso hoje é outra, com maior protagonismo dos deputados e senadores, e que qualquer medida que possa gerar ruídos na economia em ano pré-eleitoral deverá ser discutida previamente com o Parlamento.
Apesar das discordâncias quanto às propostas, parlamentares enxergaram como positivo o formato do encontro. Eles disseram que essa espécie de fórum de debates entre Câmara, Senado e governo federal não ocorreu no ado, muito por conta da relação estremecida entre os então presidentes das duas Casas, Arthur Lira (PP-AL) e Rodrigo Pacheco (PSD-MG). Agora, com isso, é possível definir em conjunto as medidas propostas, além de sugerir encaminhamentos que estejam alinhados entre as duas Casas.
REDUÇÃO DO IOF
– Corte médio de 65% nas alíquotas estabelecidas pelo governo em decreto de maio
– Redução de 80% na operação de risco sacado: fim da tributação da parte fixa e redução da alíquota diária
– Redução do IOF de crédito para empresas
– Redução de IOF no seguro de vida VGBL
– Alíquota mínima sobre Fundos de Investimento em Direito Creditório (FIDC)
– Isenção de IOF no retorno de investimentos estrangeiros diretos no país
MEDIDAS DE AUMENTO DE ARRECADAÇÃO
– Aumento da taxação de apostas esportivas: de 12% para 18%
– Aumento nas alíquotas da CSLL (Contribuição Social sobre Lucro Líquido) sobre fintechs e corretoras
– Cobrança de Imposto de Renda de 5% sobre títulos atualmente isentos (LCIs, LCAs, CRIs, CRAs e outros)
– Aumento da tributação sobre J (Juros sobre Capital Próprio)
CORTES DE DESPESAS FICARAM PARA DEPOIS
– Governo vai enviar projeto de lei complementar prevendo corte linear de isenções tributárias
– Congresso vai discutir proposta de reforma istrativa
– Não houve acordo para revisão do aumento da contribuição da União ao Fundeb, para a concessão do BPC (Benefício de Prestação Continuada) e para mudanças no piso constitucional de saúde e educação