O povo indígena Rikbaktsa, no noroeste de Mato Grosso, está reativando a produção de borracha nativa a partir do látex das seringueiras, prática interrompida há mais de dez anos. A iniciativa busca gerar renda local, fortalecer a preservação da floresta e estabelecer um comércio direto com compradores, sem intermediários ou “patrões”.
Retorno respeitoso à floresta
Na retomada da atividade, os Rikbaktsa aplicam técnicas tradicionais de extração: os cortes na casca das seringueiras são leves, respeitam os ciclos de regeneração e incluem períodos de descanso para garantir a recuperação das plantas. Com seringueiras que podem ultraar 200 anos de idade, essa prática sustentável não só protege as árvores – consideradas “mães da floresta” – mas também reforça o papel dos indígenas como guardiões do território.
Parcerias e estruturação da cadeia
O projeto Juntos pela Amazônia – Revitalização da Cadeia Extrativista da Borracha integra ONGs nacionais e internacionais e empresas como a Michelin, que comprou 17 toneladas de borracha dos Rikbaktsa em 2008. Agora, o arranjo é operacionalizado pelo Biodiverso (OSCIP Pacto das Águas), que, com patrocínio da Petrobras, oferece formação, educação ambiental, equipamentos e logística de escoamento. A meta é comercializar 90 toneladas de borracha nativa até 2027, abrangendo seis Terras Indígenas e a Resex Guariba-Roosevelt.
Vozes da retomada
Em Pé de Mutum (TI Japuíra), o seringueiro aposentado Donato Bibitata, de 67 anos, relembra os desafios e celebra a nova fase:
“Tem que ter paciência, tem que ter dó também, não pode machucar muito. Se não, ela morre.”
Já o jovem Rogerderson Natsitsabui, de 30 anos, vê na extração uma oportunidade de complementar renda e investir nos estudos:
“Vou trabalhar para mim, estou necessitando e acredito que muitos jovens estão no mesmo barco, então isso vai fortalecer muito.”
Preços e justiça comercial
Até 2024, a borracha da Resex Guariba-Roosevelt foi vendida a R$ 15/kg, totalizando R$ 123 mil em receitas. A partir de 2025, o látex extraído nas TIs do noroeste mato-grossense será comercializado a R$ 13/kg para a Michelin, em condições definidas diretamente com as associações indígenas. Segundo Jhassem Siqueira, analista de sustentabilidade do Memorial Chico Mendes, “esse novo paradigma elimina a figura do patrão e assegura um preço justo”.
Área atendida | Tonelagem prevista até 2027 | Principais compradores |
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TIs Erikpatsa, Japuíra, Escondido, Arara do Rio Branco, Aripuanã e Resex Guariba-Roosevelt | 90 t de borracha | Michelin, Veja (Resex) |
Impacto socioambiental
O Biodiverso tem como objetivo apoiar 300 extrativistas na produção de 800 t de castanha, 90 t de borracha e 15 t de óleo de copaíba até 2027, colaborando para a conservação de 1,4 milhão de hectares de floresta em pé. Para Gregório Araújo, gerente de projetos ambientais da Petrobras, “o projeto dialoga com soluções baseadas na natureza e demonstra ações concretas de responsabilidade socioambiental”.