SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Pelo terceiro dia seguido, soldados de Israel abriram fogo na manhã desta terça-feira (3) perto de um local de distribuição de ajuda humanitária no sul da Faixa de Gaza, para onde uma multidão de palestinos caminhava em busca de alimento. Segundo a Cruz Vermelha, 27 pessoas foram mortas. Tel Aviv voltou a falar em “tiros de advertência”.
No domingo (1º), equipes de saúde do território palestino, controlado pelo grupo terrorista Hamas, afirmaram que ao menos 31 pessoas morreram por disparos vindos de forças israelenses em Rafah Tel Aviv nega ter atirado contra civis. Na segunda (2), três pessoas morreram e dezenas ficaram feridas, também de acordo com autoridades de saúde locais.
O último incidente, que segundo o Exército ocorreu a aproximadamente 500 metros do local de distribuição de alimentos em Rafah, é o mais recente exemplo do caos que se tornou o controverso sistema de distribuição de alimentos em Gaza apoiado por Israel e EUA.
A recém-criada GHF (Fundação Humanitária de Gaza, na sigla em inglês), um grupo privado que paga a empreiteiros americanos para distribuir alimentos em áreas ocupadas por Israel no sul de Gaza, começou a operar na semana ada com apenas quatro pontos de distribuição.
A quantidade é considerada por entidades como insuficiente para a escassez no território, que ou por um bloqueio de quase três meses imposto por Israel. Sob o sistema de distribuição anterior, coordenado pela ONU, havia cerca de 400 pontos.
As Nações Unidas não estão participando do novo esforço. Segundo autoridades israelenses, a fundação vai verificar se as famílias atendidas têm envolvimento com o Hamas antes de distribuir a comida, o que violaria princípios humanitários de neutralidade e imparcialidade.
A ONU afirma ainda que o grupo coloca civis em perigo, forçando-os a caminhar por quilômetros para obter alimentos em locais arriscados. Também argumenta que a estratégia pode facilitar o plano israelense de deslocar a população do norte de Gaza, já que todos os pontos de distribuição estão no sul do território.
Nesta terça, o Exército israelense disse que as tropas atiraram perto de “algumas pessoas” que se desviaram da rota designada para o local e que não responderam a tiros de advertência. O comunicado os chamou de suspeitos e disse que eles “representavam uma ameaça” aos soldados.
Mais tarde, um porta-voz militar fez um alerta para que moradores de Gaza não se mudem para áreas que levam aos centros de distribuição e classificou essas regiões de “zonas de combate”. O Exército disse estar ciente dos relatos de vítimas e que estava investigando o caso.
Segundo projeção da Classificação Integrada da Fase de Segurança Alimentar (IPC), iniciativa apoiada pela ONU, 100% da população de 2,1 milhões de pessoas no território está em risco de insegurança alimentar, e 470 mil estão em “níveis catastróficos” de fome.
A GHF disse estar ciente dos relatos de tiros longe da área do local de ajuda nesta terça-feira, mas afirmou que o ponto de distribuição em si operou “com segurança” durante toda a manhã. Grupos de ajuda, no entanto, disseram que o derramamento de sangue mais recente demonstrou os riscos do novo sistema.
Israel diz que o método é necessário para impedir que o Hamas roube e estoque alimentos, além de financiar seu esforço de guerra vendendo alimentos para civis a preços elevados. Autoridades da ONU argumentam que não há evidências de que a ajuda internacional tenha sido desviada pela facção terrorista.
“Os eventos de hoje mostraram mais uma vez que esse novo sistema de entrega de ajuda é desumanizador, perigoso e severamente ineficaz”, disse Claire Manera, coordenadora de emergência dos Médicos Sem Fronteiras, em um comunicado. “Resultou em mortes e ferimentos de civis que poderiam ter sido evitados. A ajuda humanitária deve ser fornecida apenas por organizações humanitárias que tenham a competência e determinação para fazê-lo de forma segura e eficaz.”
Muitas das vítimas dos tiros foram levadas ao hospital do Comitê Internacional da Cruz Vermelha em Rafah. Na terça-feira, a clínica recebeu os corpos de 19 pessoas, além de oito outras que posteriormente morreram devido aos ferimentos, disse a organização em um comunicado.
Horas após as denúncias das 27 pessoas mortas nesta terça, a Fundação Humanitária de Gaza anunciou a nomeação de um líder evangélico conservador como seu novo presidente. O escolhido foi o reverendo americano Johnnie Moore, que já trabalhou com o presidente Donald Trump em questões de liberdade religiosa, segundo a agência de notícias AFP.
No ado, Moore já adotou posicionamento de confronto com a ONU. Depois que o secretário-geral da organização, António Guterres, disse no último domingo ter ficado horrorizado com “os relatos de palestinos mortos enquanto buscavam ajuda em Gaza”, o reverendo disse que a informação era falsa.
“Senhor secretário-geral, trata-se de uma mentira espalhada por terroristas e o senhor continua espalhando. Por favor, corrija”, publicou Moore na plataforma X, referindo-se a Guterres.