Depoimento de Bolsonaro suavizou imagem para público fora do tribunal, avaliam aliados

BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – Aliados de Jair Bolsonaro (PL) avaliam que o ex-presidente conseguiu aproveitar o depoimento ao STF (Supremo Tribunal Federal) no processo por tentativa de golpe para transmitir ao público fora do tribunal o que seria uma imagem positiva, com pedido de desculpas e brincadeiras com o ministro Alexandre de Moraes.

Para esses interlocutores de Bolsonaro, o episódio pode ajudá-lo a reforçar em alguns grupos a percepção de que o interrogatório foi um rito meramente formal para condená-lo. Ainda assim, afirmam que o ex-presidente conseguiu se apresentar com uma imagem mais leve e desconstruir argumentos apresentados pela PGR (Procuradoria-Geral da República).

No depoimento, na terça-feira (10), Bolsonaro itiu pela primeira vez ao STF ter estudado junto aos chefes das Forças Armadas possibilidades de interferência no resultado das eleições após a derrota para o presidente Lula (PT) em 2022.

Segundo essa interpretação, o ex-presidente teria feito gestos para tentar ganhar simpatia de um público que pode ir além dos seus apoiadores. Na opinião de pessoas próximas a Bolsonaro, o ex-presidente teria demonstrado humildade ao pedir desculpas a Moraes, reforçado uma imagem informal ao fazer uma brincadeira com o ministro e apresentado argumentos para se afastar da responsabilidade pelos ataques de 8 de janeiro.

“Fantástico o depoimento dele. Se ele tiver um julgamento isento, justo, é para ele ser absolvido. Porque foi por terra toda a narrativa que tinha sido criada por pressão em cima do [Mauro] Cid, que, na minha cabeça, inventou muita coisa”, disse à Folha de S.Paulo o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) sobre o pai.

“Mas a parte mais importante, para mim, foi a desconstrução do 8 de Janeiro. No mundo, mais de mil celulares foram apreendidos, periciados, não tem qualquer incentivo, troca de mensagem, para tratar do 8 de Janeiro. O próprio Cid confirma, na avaliação dele, que isso nunca foi tratado, e isso é verdade.”

Uma das principais vitórias políticas de Bolsonaro no depoimento, para interlocutores do ex-presidente, foi o pedido de desculpas a Moraes, por ter dito que ele e outros dois ministros do STF, Edson Fachin e Luís Roberto Barroso, estariam ganhando dinheiro para favorecer Lula nas eleições.

“Me desculpem, não tinha essa intenção de acusar de qualquer desvio de conduta dos senhores. Minha retórica me levava a falar dessa maneira. Essa reunião não era para ser gravada, era reservada. Alguém gravou de má-fé, senão eu não estaria explicando aqui agora”, disse Bolsonaro no interrogatório.

De acordo com aliados, o ato pode ser visto como uma exibição de humildade e, em alguma medida, melhorar a reação do público a ele. Um dos maiores temores era justamente de que ele se irritasse com os questionamentos do ministro e reforçasse um tom autoritário -o que não ocorreu.

Quem esteve com Bolsonaro nos últimos dias relatou sua preocupação com o depoimento e disse que ele está ciente da gravidade do caso, inclusive da possibilidade de ser preso ao final do processo.

No início do depoimento, que durou cerca de duas horas, o ex-presidente aparentava estar nervoso e um pouco rouco. Depois, chegou a brincar com Moraes, convidando-o para ser seu vice em 2026, mesmo inelegível. O ministro respondeu que declinaria da proposta.

Segundo um aliado, a aparente descontração do ex-presidente também seria importante para mostrá-lo como ível a quem assistisse ao depoimento. Em outra frente, ele seguiu a linha da estratégia da defesa, de não negar as provas apresentadas pela PGR, mas dar uma explicação própria.

Especialistas ouvidos pela reportagem afirmam que Bolsonaro e Cid deturparam noções de legalidade para justificar discussões golpistas que teriam como objetivo impedir a posse de Lula.

Um exemplo disso, dizem, foi a fala em que Bolsonaro repetiu ter agido sempre dentro dos limites da Constituição ao mesmo tempo em que itiu ter conversado sobre “alternativas”, como estado de sítio -em contexto legal que não justificava a medida, pois não há previsão de que seja usada para reverter resultado eleitoral.

Durante a sessão de terça, o ex-ministro da Defesa Paulo Sérgio Nogueira, que também é réu, disse que alertou Bolsonaro sobre a gravidade da decretação de medidas de exceção após a vitória de Lula.

“Depois que terminou a reunião [de 7 de dezembro de 2022], eu cheguei ao presidente, o [comandante do Exército] Freire Gomes estava do meu lado. Alertamos da gravidade, se ele estivesse pensando em estado de defesa e estado de sítio”, disse o general.

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