Após uma polêmica envolvendo uma regra que restringia a participação de homens trans no desfile de carnaval, o tradicional bloco de afoxé Filhos de Gandhy, em Salvador, anunciou na noite desta segunda-feira (24) a revogação da exigência. A decisão foi divulgada por meio de um comunicado publicado nas redes sociais, em que a agremiação expressou disposição ao diálogo e à reflexão sobre como conciliar a preservação de suas tradições com as questões contemporâneas de inclusão social.
A controvérsia surgiu quando, inicialmente, o bloco impôs uma cláusula em seu regulamento que permitia a participação exclusivamente de homens cisgêneros no evento. O critério constava em um comunicado entregue aos associados durante a retirada das fantasias, que mencionava um artigo do estatuto social do grupo, indicando que apenas pessoas do sexo masculino cisgênero poderiam ingressar na associação.
Após a repercussão negativa, o bloco divulgou uma nova nota, na qual afirmou ter “recolhido o termo de aceite” e substituído a menção a “masculino cisgênero” pela expressão “sexo masculino”, permitindo a inclusão de homens trans na agremiação. A agremiação também ressaltou que, embora seu estatuto tenha sempre refletido as tradições e os fundamentos da irmandade, estava aberta às discussões sobre a evolução das normas internas.
“Estamos sempre dispostos ao diálogo respeitoso e à reflexão sobre como manter nossas tradições vivas, ao mesmo tempo em que acolhemos as discussões da sociedade”, afirmou o comunicado.
Ministério Público da Bahia investiga possível transfobia no caso
O episódio gerou reações negativas e, em resposta à polêmica, o Ministério Público da Bahia (MPBA) instaurou um procedimento para investigar a possível prática de transfobia. A instituição emitiu uma nota, informando que oficiou o bloco solicitando esclarecimentos sobre o caso e que aguardava o retorno para tomar as medidas cabíveis.
“O Ministério Público da Bahia instaurou, nesta segunda-feira, dia 24, procedimento para apurar suposto ato de transfobia em cláusula do estatuto social do bloco Filhos de Gandhy. O MPBA oficiou por e-mail a agremiação solicitando informações e esclarecimentos e aguarda retorno para adoção das medidas cabíveis”, diz a nota do órgão.
Reações nas redes sociais e postura do bloco
A decisão de barrar a participação de pessoas trans foi amplamente criticada nas redes sociais, gerando uma onda de protestos e questionamentos por parte de seguidores do bloco. Muitos internautas consideraram a medida discriminatória e transfóbica, o que levou o Filhos de Gandhy a revisar sua postura.
Em seu comunicado, o bloco reconheceu que a sociedade está em constante transformação e ressaltou a importância dos debates sobre inclusão social. A agremiação enfatizou que, ao longo de seus 76 anos de existência, sempre buscou preservar os valores de paz, respeito e tradição, e que seu estatuto refletia os princípios que nortearam a irmandade desde a sua fundação.
“Tradicionalmente, e de acordo aos preceitos que o regem desde o início, o Afoxé Filhos de Gandhy é formado apenas por pessoas do sexo masculino, de toda raça, credo, cor, religião, orientação sexual, partido político ou classe social”, afirmou o bloco, que também anunciou que realizará uma assembleia para discutir mudanças no estatuto e buscar uma resolução mais inclusiva para o futuro.
Com a retirada da cláusula que impedia a participação de homens trans, o bloco tenta evitar uma imagem de discriminação, ao mesmo tempo em que mantém seu compromisso com a preservação de sua identidade cultural e religiosa. A postura mais flexível, que agora reflete uma aceitação das mudanças sociais, deverá ser acompanhada de perto pelos seguidores e pela opinião pública.
Com a reabertura do diálogo sobre a inclusão de pessoas trans e outros grupos historicamente marginalizados, o Filhos de Gandhy mostra estar disposto a revisar suas tradições e adaptá-las aos novos tempos, buscando equilibrar seu legado cultural com a necessidade de ser mais inclusivo.