SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A Flotilha da Liberdade, iniciativa que pretendia levar ajuda humanitária à Faixa de Gaza e carregava 12 ativistas a bordo, incluindo um brasileiro, anunciou na noite deste domingo (8) já madrugada de segunda-feira no horário local que a embarcação Madleen foi interceptada e atacada por militares israelenses.
O barco partiu da Itália em 1º de junho com uma quantidade simbólica de alimentos e remédios com destino a Gaza. O território palestino enfrenta uma grave crise humanitária após Israel bloquear a entrada de ajuda por quase três meses, entre março e maio deste ano.
“A comunicação com o Madleen foi perdida. Os militares israelenses abordaram o navio”, disse no Telegram a Flotilha da Liberdade, coalizão internacional pacífica que reúne diversos movimentos e iniciativas que atuam contra o bloqueio de Tel Aviv a Gaza.
O incidente levou o Itamaraty a se manifestar. “O governo brasileiro acompanha com atenção a interceptação, pela Marinha israelense, da embarcação Madleen, que se dirigia à costa palestina para levar itens básicos de ajuda humanitária à Faixa de Gaza e cuja tripulação, composta por 12 ativistas, inclui o cidadão brasileiro Thiago Ávila”, diz nota divulgada pelo Ministério das Relações Exteriores.
A pasta mencionou a liberdade de navegação em águas internacionais, pediu ao governo israelense para libertar os tripulantes detidos, e destacou a necessidade de que Israel remova imediatamente todas as restrições à entrada de ajuda humanitária em território palestino.
As embaixadas na região estão sob alerta para, caso necessário, prestar a assistência. Na França, onde acompanha a visita do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), o ministro Mauro Vieira, das Relações Exteriores, falou rapidamente sobre a situação. “Estamos torcendo para andar tudo bem”, afirmou.
O Madleen leva a bordo a sueca Greta Thunberg e o ativista brasileiro Thiago Ávila, além de outras dez pessoas. Em um vídeo publicado nas redes sociais de Ávila neste domingo, ele pede que a população pressione o governo brasileiro a romper relações com Israel.
“Se você está vendo este vídeo, isso significa que eu fui detido ou sequestrado por Israel ou outra força cúmplice no Mediterrâneo”, afirmou. “Nesse caso, eu peço a vocês para pressionar o meu governo e os governos de meus companheiros para que sejamos libertos e para que as relações com Israel sejam rompidas.”
Também nas redes sociais, a esposa de Thiago Ávila publicou um vídeo em que pede ajuda ao governo brasileiro.
“Recebemos uma mensagem de que eles estavam sendo interceptados e atacados pelo Exército israelense. Que o Exército estava subindo no barco”, afirma Lara na postagem. “Cobrem o Itamaraty, o governo brasileiro, as figuras públicas para trazer o Thiago e todos os participantes [da iniciativa] de volta para suas famílias.”
Em uma publicação no Instagram, o perfil da Flotilha da Liberdade divulgou um vídeo que mostra os ativistas sendo abordados. “Momentos atrás, drones lançaram produtos químicos não identificados sobre o Madleen”, diz o texto que acompanha o post. “Imediatamente depois, nossos voluntários foram interceptados antes que as forças israelenses abordassem a embarcação. Perdemos todo o contato com eles segundos depois.”
Entre os ativistas a bordo estava também Rima Hassan, uma deputada franco-palestina do Parlamento Europeu que compartilhou mensagens de hora em hora nas redes sociais para que seus seguidores acompanhassem o momento em que o navio perdesse a comunicação.
“Drone acima de nós!”, afirmou na rede social X durante a interceptação. Em seguida, ela publicou uma imagem do convés do navio com manchas que se pareciam tinta branca. “O drone acima de nós lançou um líquido branco”, afirmou.
Anteriormente, o ministro da Defesa de Israel, Israel Katz, havia ordenado que o Exército impedisse a chegada do veleiro. “O Estado de Israel não permitirá que ninguém rompa o bloqueio marítimo de Gaza, cujo principal objetivo é impedir a entrega de armas ao Hamas”, afirmou, embora a medida afete também a entrega de medicamentos e comida. Katz elogiou a “captura rápida e segura da flotilha Madleen para impedi-los de romper o bloqueio”.
O ministro disse ainda ter orientado os soldados a “mostrar aos ageiros o vídeo dos horrores do massacre de 7 de outubro quando chegassem ao porto de Ashdod”. “É apropriado que a antissemita Greta e seus companheiros apoiadores do Hamas vejam exatamente quem é essa organização terrorista que eles vieram apoiar e para quem eles estão trabalhando”, afirmou, repetindo o ataque feito à ativista sueca no dia anterior.
Segundo o Ministério das Relações Exteriores de Israel, a Marinha desviou a rota do navio para a costa israelense e os tripulantes estão em segurança. “Todos os ageiros do ‘iate das selfies’ estão seguros e ilesos. Eles receberam sanduíches e água. O show acabou”, publicou a chancelaria no X. “A pequena quantidade de ajuda no barco que não foi consumida pelas ‘celebridades’ será transferida para Gaza por meio dos canais humanitários adequados.”
O navio foi desviado para o porto de Ashdod, no sul de Israel, perto de Gaza, onde os ageiros desembarcarão, indicou o Ministério da Defesa de Israel.
A relatora especial da ONU sobre direitos humanos nos territórios palestinos, sca Albanese, apoiou a ação da flotilha e pediu que outros barcos desafiassem o bloqueio imposto por Tel Aviv. “A jornada de Madleen pode ter terminado, mas a missão não acabou. Todos os portos do Mediterrâneo devem enviar barcos com ajuda e solidariedade para Gaza”, escreveu ela no X.
Segundo a mídia israelense, militares planejavam interceptar o barco e escoltá-lo até o porto de Ashdod, no sul do país. A tripulação seria então deportada a previsão era de que o veleiro chegasse ao litoral de Gaza na manhã desta segunda-feira (9).
Em 2 de março, Israel impôs um bloqueio total à entrada de alimentos e medicamentos no território. Após uma suspensão total da ajuda por 78 dias, o governo de Binyamin Netanyahu flexibilizou a entrada de ajuda diante da crescente pressão internacional, mas com um novo sistema de entrega que não consegue atender a população, segundo organizações humanitárias.
A iniciativa da flotilha existe desde 2008. Em 2010, um grupo de sete embarcações, incluindo o turco Mavi Marmara, foi atacada por Israel nove pessoas morreram e 50 ficaram feridas. Uma investigação do Conselho de Direitos Humanos da ONU concluiu que o ataque israelense foi desproporcional e ilegal. Na época, Tel Aviv disse ter agido em defesa própria.
Em abril de 2024, três relatores especiais da ONU exigiram agem segura para a Flotilha da Liberdade. Eles afirmaram que Israel deve cumprir o direito internacional e as ordens da Corte Internacional de Justiça, permitindo a entrada irrestrita de ajuda humanitária em Gaza.